Tive um professor na pós graduação, que gostava de dizer que a definição científica de problema é: Problema é tudo aquilo que tem solução. Se não tem solução é fato, não problema.
Há tempos busco a origem de tal afirmação e nunca a encontrei com precisão. Já encontrei provérbios chineses, definições linguísticas e ditados populares que são parecidos, mas nunca encontrei esta definição assim tão escancarada. Independente da origem, há alguns anos tenho dividido os problemas que encontro na vida nestas duas categorias: problemas e fatos. Me concentro nas possíveis soluções da primeira categoria e me preparo para conviver e aceitar (ou não) os fatos da segunda. Por incrível que parece, isso tem me ajudado bastante a analisar os desafios técnicos que encontro na minha vida profissional diariamente.
É sob esta ótica que gostaria de propor uma reflexão sobre as reais oportunidades de negócios que estão surgindo com o advento do que chamamos de Internet das Coisas (ou Internet of Things – IoT em inglês).
Muito do que tenho lido e visto sobre o assunto, parte do princípio da aplicação das tecnologias de IoT à solução de problemas já identificados hoje. Em outras palavras, muito do que vemos são propostas de soluções mais elegantes ou inteligentes do ponto de vista da tecnologia, mas acredito que pensar assim é ver apenas a ponta do iceberg: o IoT permite resolver problemas que jogamos hoje na categoria “sem solução”.
A reflexão que proponho, e da qual acredito que grandes ideas de produtos e serviços poderão sair é a de definitivamente esquecer as limitações tecnológicas que encaramos nos últimos anos, e procurar soluções alternativas aos problemas que encaramos no nosso dia a dia. Acredito que a verdadeira inovação do IoT deve nascer desta quebra no modelo de raciocínio estritamente técnico que temos hoje, onde sob a luz da tecnologia que conhecemos propomos uma solução técnica para um problema existente. Em outras palavras, o que quero propor é que deixemos mais as ideias correrem soltas antes de colocarmos a elas as amarras e limitações das tecnologia que conhecemos (até porque aposto que tem bastante coisa no mundo do IoT que muita gente sequer imagina que existe :) ).
Existem vários exemplos disso, como a utilização eficiente de pesticidas na agricultura (será que eu não consigo medir com maior precisão uma área da plantação afetada, identificar a praga e agir especificamente ali), ou o rastreamento inteligente de alimentos perecíveis (será que uma empresa de distribuição de carne resfriada não consegue saber com antecedência que um determinado percentual da sua carga em um caminhão já não está mais em condições ideais de consumo, e tomar a decisão de recolher a carga ao invés de entregar uma bela encrenca para seu cliente final) chegando a coisas mais simples do nosso cotidiano, como encontrar uma forma mais inteligente e divertida de me ajudar a perder os kilos que preciso (através de wearables que meçam com mais precisão o meu consumo diário de calorias, integrados a apps que medem a minha ingestão diária de alimentos) ou ainda alguma coisa que me ajude a responder a pergunta assustadora que me faço quase toda noite: será que tomei a dose correta do meu remédio da pressão hoje ?
Não é apenas o monitoramento indiscriminado de dados e informações, mas a utilização efetiva e em tempo hábil destas informações, para que pessoas e empresas tomem decisões adequadas com maior efetividade. Não é também a utilização de tecnologia de ponta a um custo de milhares de dólares, mas sim o projeto de soluções que utilizem dispositivos praticamente descartáveis (a um custo mínimo, pensando inclusive na possibilidade de reuso).
Como podem ver, a construção deste tipo de dispositivos ou aplicações demanda não apenas uma solução de hardware, mas muito software e integração entre dispositivos e nuvem para que tudo funcione a contento, e é essa a grande oportunidade que vejo para as empresas brasileiras neste novo mundo, e cá entre nós, quando o assunto é criatividade e “dar um jeito” em problemas do cotidiano, somos especialistas. Para os que acham isso ufanismo, sugiro a pesquisa que tenho feito há anos: sempre que encontrar um estrangeiro, pergunte a ele como se aperta parafuso no dia a dia das famílias em seu país. Depois que ele responder, conte que apertamos com uma faca, e veja a reação... eu adoro :D
O primeiro passo e que realmente vai importar nesse novo mundo, é relativamente simples de conseguir: Sabe aquela coisa que te incomoda ou incomoda o seu cliente todo dia, aquela que você deixou de lado pois não tinha solução ? Que tal revisitá-la sem pensar imediatamente nas amarras da tecnologia ?